Pessoas atingidas questionam como serão usados os recursos do Plano Estadual de Ação em Saúde, lançado pelo governo de Minas Gerais

O Plano Estadual, lançado no último dia 13, em Ipatinga, faz parte do Acordo de Repactuação e prevê investimentos de 424 milhões de reais nos municípios atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão. As pessoas atingidas dos Territórios de Rio Casca e Adjacências e do Parque Estadual do Rio Doce não participaram da elaboração da proposta

No dia 13 de novembro foi lançado, em Ipatinga, o Plano Estadual de Ação em Saúde de Minas Gerais, previsto no Anexo 08 do Acordo de Repactuação. O Plano destinará 424 milhões de reais para 38 municípios mineiros atingidos pelo rompimento da barragem de Fundão. Com apoio ATI prestada pela Cáritas Diocesana de Itabira, 22 pessoas atingidas, membros de Comissões Locais Municipais nos Territórios de Rio Casca e Adjacências (Território 01) e do Parque Estadual do Rio Doce e sua Zona de Amortecimento (Território 02), acompanharam a cerimônia de lançamento. 

O lançamento do Plano Estadual de Ação em Saúde teve a participação do governador do estado de Minas Gerais, Romeu Zema, do vice-governador Mateus Simões, de parlamentares, além de prefeitos e demais autoridades municipais, mas não contou com a fala de atingidos (as) presentes no espaço.

O Anexo 08 do Acordo de Repactuação trata das compensações pelos danos à saúde das pessoas atingidas. Nele, estão previstos 12 bilhões de reais em ações de saúde coletiva na Bacia do Rio Doce e Litoral Norte Capixaba, ao longo de 20 anos. Deste montante, 8,4 bilhões serão aplicados em fundo específico, que garantirá o rendimento dos recursos para ações futuras. Outros 3,6 bilhões estão previstos para ações imediatas, dos quais 815,8 milhões serão investidos pelo Ministério da Saúde e 424 milhões pelo governo do estado de Minas Gerais. Outros recursos serão destinados ao estado do Espírito Santo (260 milhões), à Fundação Oswaldo Cruz (300,2 milhões) e diretamente aos municípios atingidos (1,8 bilhões). 

Os recursos da Repactuação destinados através do Ministério da Saúde foram pagos aos municípios atingidos no mês de setembro, por meio do Programa Especial de Saúde do Rio Doce (PES Rio Doce). Já os recursos que foram para o governo de Minas Gerais deverão ser executados somente com a aprovação do Plano Estadual de Ação em Saúde. 

Nos Territórios 01 e 02 todos os municípios já elaboraram seus Planos Ação em Saúde e já receberam os recursos [do Ministério da Saúde] para os anos de 2025 e 2026. Esses Planos de Ação precisam ser aprovados pelo Comitê Especial Tripartite* para depois serem executados. O governo de Minas Gerais lançou agora o seu Plano, que garantirá recursos adicionais para os municípios. Então, daqueles recursos já repassados pelo governo federal aos municípios atingidos, ainda teremos também esses do Plano Estadual”, explicou Cintya Alvim, assessora técnica da equipe de Saúde Coletiva e Proteção Social da ATI Cáritas Diocesana de Itabira.    

O Comitê Especial Tripartite (CET), juntamente com a Câmara Técnica, compõe a estrutura de governança do Programa Especial de Saúde Rio Doce, conforme estabelecido no Apêndice 8.2 do Acordo de Repactuação. Trata-se de um órgão colegiado deliberativo responsável pela coordenação de ações e investimentos em saúde da população atingida. O CET é composto por representantes do Ministério da Saúde, das Secretarias de Estado da Saúde de Minas Gerais e do Espírito Santo, e também por representantes da área da saúde dos municípios atingidos.  

De acordo com o governo de Minas Gerais, dos 424 milhões de reais previstos pelo Plano Estadual de Ação em Saúde, 220 milhões deverão ser investidos já na primeira etapa, entre 2025 e 2026, na construção de Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e de Centros de Atenção Psicossocial (Caps), aquisição de equipamentos hospitalares e investimentos em 7 consórcios de saúde, com foco na ampliação da Atenção Primária, fortalecimento da rede hospitalar e psicossocial, apoio às gestões municipais e à vigilância em saúde. 

Ainda, segundo publicação divulgada no site do governo de Minas Gerais, “as ações visam garantir 100% de cobertura de Atenção Primária nos municípios atingidos, além de melhorar o acesso aos serviços especializados, beneficiando 1,27 milhões de moradores dos municípios atingidos”. 

No entanto, no lançamento do Plano Estadual de Ação em Saúde não foram especificados onde e de que forma os recursos serão aplicados em cada município, nem os critérios para os investimentos nas comunidades atingidas, o que gerou críticas das pessoas atingidas, que não puderam fazer os questionamentos durante a cerimônia. 

Esse Plano Estadual não vai atender os atingidos. Primeiro de tudo, sobre a Repactuação nos municípios, está havendo muita desorganização nas comunidades, porque eles não estão olhando o coletivo. Então, todo esse recurso que está vindo, na hora que for distribuído, eu acho que não vai atender os atingidos. O governo de Minas não está dialogando com os atingidos, nem um bocadinho. Montaram tudo e apresentaram e os atingidos vão ter que engolir tudo do jeito que eles querem. Então eu protesto mesmo. Não teve participação dos atingidos nesse Plano (Plano Estadual), em nada”, disse Silvio Martins Soares, atingido morador da comunidade da Pirraça, membro do Conselho Municipal de Saúde de São Pedro dos Ferros e da Comissão Local Territorial 01.

Nenhum atingido teve oportunidade de falar. Pra mim isso foi uma palestra. Eu acho que nenhum atingido saiu de lá satisfeito. Esse negócio de construção UBS em monte de lugar. Não adianta construir um monte de UBS se o município não tem recurso para manter ela. Então, alguma coisa contradiz a verdade. Tinha que ter um veículo que informasse à Comissão [Local das Pessoas Atingidas] sobre os recursos que estão vindo. Um e-mail ou outra coisa qualquer, pra gente poder fiscalizar. Falaram que a necessidade é a comunidade que sabe, mas eles não ouviram nenhuma comunidade”, disse José Teodoro da Silva (Seu Durico), pescador atingido de Pingo d’Água e membro da Comissão Local Territorial 02. 

Embora não tenha sido informado ainda como serão as aplicações dos recursos previstos no Plano Estadual de Ação em Saúde, o Acordo de Repactuação, homologado em 2024, prevê o direito à informação e à informação das pessoas atingidas, além de diretrizes para a garantia da participação e controle social, o que reforça a importância de um processo de execução transparente para os territórios atingidos ao longo de toda a Bacia do Rio Doce. 

“A presença das pessoas atingidas nestes espaços se torna importante e necessária, principalmente por não terem participado da construção efetiva destes planos, no nível estadual ou municipal. Dessa forma, este é o papel da ATI, levar informação e provocá-los a ter incidência nesses espaços e principalmente mostrar a importância destes dentro dos conselhos municipais de políticas públicas, espaços legítimos e  estratégicos de participação e controle social”, afirmou Karina Leão, coordenadora da equipe Saúde Coletiva e Proteção Social da ATI Cáritas Diocesana de Itabira. 

A Assessoria Técnica Independente prestada pela Cáritas Diocesana de Itabira, em conformidade com seu Plano de Trabalho, seguirá buscando informações sobre as ações de reparação e promovendo atividades que garantam a participação informada, além de apoiar as pessoas atingidas no exercício do controle social sobre as ações executadas a partir do Acordo de Repactuação. 

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