Pessoas atingidas dos Territórios 01 e 02 participam da 77ª reunião do Comitê Interfederativo e reivindicam maior participação nas ações pela reparação integral 

Nos dias 27 e 28 de junho ocorreu a 77ª reunião ordinária do Comitê Interfederativo (CIF), em Governador Valadares, com o objetivo de avaliar as medidas que vêm sendo tomadas pela reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão. 

Pessoas atingidas dos Territórios 01 (Rio Casca e Adjacências) e 02 (Parque Estadual do Rio Doce e sua Zona de Amortecimento) estiveram presentes no encontro, acompanhadas da equipe do projeto de ATI Cáritas Diocesana de Itabira. Dentre as pautas da reunião, foram discutidos os resultados dos programas de reparação e as deliberações das Câmaras Técnicas.

Foto: Miguel Araujo / Cáritas Diocesana de Itabira
Foto: Miguel Araujo / Cáritas Diocesana de Itabira

De acordo com Amanda Cleomara, Coordenadora da equipe de Humanidades e Educação da ATI, “a 77ª reunião do CIF foi marcada por intensos debates e muita participação popular. É por meio da participação nas reuniões do Comitê Interfederativo que as pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão reafirmam a importância de serem ouvidas no processo de reparação”

A participação da ATI junto com as pessoas atingidas nessas reuniões, é uma forma de garantir um melhor entendimento sobre as informações transmitidas e uma participação efetiva. “Realizamos um acompanhamento sistemático das discussões fomentadas nas diferentes instâncias e garantimos que as informações cheguem com uma linguagem acessível e coerente à realidade das pessoas atingidas, possibilitando que elas construam questionamentos, reivindiquem direitos e se organizem para compor  os diferentes espaços ligados à busca por uma reparação integral”, complementou Amanda. 

Participação das pessoas atingidas 

Na ocasião, as Comissões Locais de Atingidos(as) reivindicaram maior participação e deliberação nos estudos e ações que envolvem a reparação. Além disso, demandaram a apresentação de projetos, estudos e laudos dos danos ambientais causados nos territórios.

“A Renova e as empresas fazem laudos e exames, mas eu pergunto a vocês: quem aqui tem o resultado que apresenta que essa água não está contaminada? A gente precisa muito que vocês ofereçam um pouco de dignidade pra gente, pelo menos pra sabermos se podemos beber da água que temos hoje. Já são 9 anos. É responsabilidade da Renova garantir a dignidade para nós atingidas e atingidos”. Silvio Martins, morador da comunidade de Pirraça, em São Pedro dos Ferros

As pessoas atingidas também denunciaram a invisibilização das mulheres atingidas no processo de reparação e a falta de escuta da Fundação Renova; apontaram que, até hoje, muitas pessoas atingidas dos Territórios 01 e 02 não foram consideradas no cadastro integrado e não tiveram acesso ao Auxílio Financeiro  Emergencial (AFE), ao Programa de Indenização Mediada (PIM) e ao Sistema de Indenização Simplificada (NOVEL) e, por isso, solicitaram a reabertura do cadastro e acesso aos programas indenizatórios. 

“O cadastro que está previsto no TTAC e foi implementado como Programa da Fundação Renova, tinha como objetivo garantir aos atingidos o acesso aos programas de reparação, mas o que se vê nos territórios é uma realidade muito diferente da colocada no papel. O cadastro já foi efetivado? Muito pelo contrário. Sem o menor critério lógico, sem a menor transparência, com critérios que mudavam sempre e a partir do interesse da Fundação Renova. Uma seleção em que a Fundação decide quem é atingido pelo rompimento da barragem. As empresas passaram a decidir quem e como teve sua vida alterada pelo dano que causaram. Uma forma muito fácil de se verificar que o cadastro não representa a realidade dos atingidos nos territórios é que ignoram o trabalho doméstico e invisibilizam as atividades de limpeza beneficiada dos pescados e tantos trabalhos realizados pelas mulheres, que representam grande parte dos atingidos”.  Simone de Fátima Nunes, moradora de São José do Goiabal 

“Eu gostaria de falar sobre as mulheres. As mulheres quando fizeram o cadastro, ligaram pra Renova pra fazer o cadastro, estavam colocando as mulheres como dependentes do homens ou dos filhos. As mulheres ficaram de fora. As mulheres que pescam, que têm como provar a pesca, não foram reconhecidas como pescadoras. Por que não foram na minha casa ver o meu barco? Ver as minhas coisas? Tem território que não foi reconhecido, isso pra mim é uma indignação. Eu preciso que alguém vá lá, de preferência o senhor [presidente da mesa]. Tô vendo a renova falar ali que não encontraram o cadastro, é mentira! Eu mandei um monte de coisas pra eles. Estão se desfazendo das mulheres” Creuza Maria Neves, moradora de Timóteo

“9 anos  de sofrimento não é brincadeira. E eu tô falando isso em nome de todo atingido da Bacia do Rio Doce, principalmente as mulheres. As mulheres são excluídas, porque tem muitos maridos que receberam, puseram o dinheiro no bolso e sumiram, largaram as mulheres “a ver navios”. Que essas mulheres sejam reconhecidas, tá? É a mulher que finaliza tudo. Se o marido é pescador, vai e pesca, quando chega em casa, quem vai limpar o peixe? Quem vai preparar o peixe pra ir pra mesa? Somos nós, né? E nós estamos esquecidas. Igual no meu caso, eu sou dependente do meu marido no cadastro desde 2016, 2017. Eu não fui reconhecida”. Conceição de Pádua Alves, moradora de São Domingos do Prata

No encontro, as Comissões Locais Territoriais protocolaram um ofício que apresenta a realidade e as principais demandas da população dos Territórios 01 e 02, entre elas: revisão dos programas de cadastro e de indenização; realização de estudos sobre a qualidade da água e do solo e reconhecimento do direito das mulheres atingidas e não reconhecidas pela Fundação Renova. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima