No mês de outubro, a ATI prestada pela Cáritas Diocesana de Itabira realizou Rodas de Diálogo com crianças e adolescentes atingidos(as) dos Territórios 01 (Rio Casca e Adjacências) e 02 (Parque Estadual do Rio Doce e sua Zona de Amortecimento). As atividades tiveram como objetivo dialogar sobre o rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 2015, e os danos que as famílias sofreram e ainda sofrem.
As Rodas de Diálogo foram realizadas em nove escolas de 10 municípios assessorados pela Cáritas Diocesana de Itabira e contaram com a participação de mais de 500 estudantes, de 8 a 17 anos, que fazem parte de turmas do ensino fundamental e médio.
Sobre a atividade, Monalisa Carmo, assessora técnica da equipe de Humanidades e Educação, aponta que “o processo reparatório apresenta um silenciamento desses grupos, tanto no que diz respeito às informações quanto no acesso a outros direitos. Por isso, vimos, na escola, uma possibilidade de garantir a participação de adolescentes, reforçar o compromisso da ATI com todas as pessoas atingidas e das escolas garantirem uma formação em que o contexto das comunidades é parte fundamental”.

Além de informar sobre o processo de reparação, os encontros tiveram o intuito de ouvir o que as crianças e adolescentes têm a dizer sobre o rompimento e a realidade de cada município. “Nos baseamos na elaboração de perguntas que poderiam traduzir em que medida aquelas e aqueles adolescentes estavam envolvidas(os) nas discussões sobre o rompimento. Questionamos se sabiam sobre o trabalho da ATI; sobre os assuntos que abordaríamos ao longo da Roda; os motivos para estarmos ali falando sobre o rompimento após nove anos. Assim, construímos o diálogo por meio de recursos visuais, como imagens e mapas que poderiam contribuir para apontar as dimensões dos danos gerados pelo rompimento”, destacou Monalisa.
No momento inicial de cada encontro, foi apresentado o contexto dos núcleos familiares atingidos dos Territórios 01 e 02 antes da chegada da Assessoria Técnica Independente. A equipe explicou que esses territórios chegaram a ser considerados uma “zona cinzenta”, pois muitas pessoas atingidas ficaram sem informações sobre o processo de reparação, não tiveram acesso amplo ao cadastramento da Fundação Renova e suas empresas terceirizadas e, por isso, sequer foram reconhecidas como atingidas.
A equipe apresentou um mapa de toda a região atingida na Bacia Hidrográfica do Rio Doce e explicou sobre o processo de implementação das ATIs e seu papel de garantir a informação qualificada às pessoas atingidas.
Em seguida, foram distribuídas algumas figuras, que remetem a possíveis danos que as famílias sofreram nos municípios atingidos, como: mortandade de peixes, enchentes, contaminação de alimentos, dificuldade de trajeto, falta de informações, desigualdade de gênero, entre outros. Os(as) estudantes que participaram puderam relatar sobre os danos identificados em suas comunidades.
Ao longo das formações, os(as) estudantes também expuseram seus entendimentos sobre as falhas nas medidas indenizatórias, por acompanharem a situação das famílias; falaram sobre o incômodo com a ausência e o controle de informações; e manifestaram a preocupação com o tempo necessário para uma possível recuperação ambiental e dos modos de vida.
Além disso, os(as) participantes compartilharam suas interpretações sobre “o que é ser atingido” e de que forma percebem que suas vidas foram alteradas após o rompimento. Ainda que essas crianças e adolescentes fossem muito novas há 9 anos, elas relatam a perda de elementos importantes do cotidiano da comunidade e da família. Práticas que fizeram parte da infância e adolescência das gerações passadas, culturas que não puderam ser vividas e experimentadas por eles(as), como o acesso ao rio para lazer e pesca, os encontros na beira do rio, o cultivo de alimentos em qualidade e grande escala e outros.
Ao final das atividades, os(as) estudantes foram convidados a escrever cartas e recados com a manifestação de seus incômodos e/ou proposições para uma reparação justa. Algumas dessas cartas, inclusive, poderiam ser endereçadas, pelos estudantes, às instituições de justiça, municípios, Fundação Renova ou empresas, por exemplo.
Monalisa Carmo pontua, também, que “de modo geral, houve um envolvimento com o assunto, até porque faz referência ao cotidiano deles. Encontramos, por exemplo, adolescentes que estão envolvidos com a pesca e falaram sobre como o rompimento da barragem interfere nisso e na relação deles com o rio”. Além disso, relata que “algumas professoras também participaram das atividades e trouxeram falas muito importantes sobre o silenciamento pedagógico enfrentado pelas escolas no que diz respeito ao rompimento da barragem. Elas apontaram como esse assunto não foi trabalhado nas escolas e o receio de tratá-lo no cotidiano escolar”.
Ana Lúcia Ramos, supervisora da Escola Estadual São Sebastião, em Sem Peixe, afirmou que a presença da Cáritas Diocesana de Itabira com a realização dessa atividade foi muito importante, pois “abriu portas para entender melhor sobre o rompimento da barragem. Trouxeram muitas informações importantes tanto pra gente, que faz parte da equipe pedagógica da escola, como também para os nossos adolescentes. Então, é muito importante a gente estar colhendo todas as informações que o grupo trouxe e, também, conscientizar quem tem o direito, pra estar correndo atrás, porque não foram resolvidas todas as questões. Torcer para o grupo que está ajudando toda a população e que a população também corra atrás das coisas e adquira seus direitos”.
Após as atividades desenvolvidas com as(os) estudantes, a ATI foi convidada a ampliar a realização das Rodas de Diálogo com outras turmas das escolas, como as do Fundamental 1 e as turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA).