ATI se reúne com comunidades quilombolas de São Domingos do Prata, atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão 

No dia 8 de junho, a equipe da Cáritas Diocesana de Itabira, no processo de assessoramento técnico às pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, reuniu com as comunidades quilombolas de Areião, Surrão e Bateeiro, no município de São Domingos do Prata. 

Esse foi o terceiro encontro entre a ATI e as comunidades quilombolas de São Domingos do Prata, com o objetivo de continuar o debate sobre direitos das pessoas atingidas e os possíveis danos decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 2015. 

As comunidades Areião, Surrão e Bateeiro são Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) assessorados pela Cáritas Diocesana de Itabira nos Territórios 01 (Rio Casca e Adjacências) e 02 (Parque Estadual do Rio Doce e sua Zona de Amortecimento).

No processo de reparação, existem diretrizes específicas que estabelecem maneiras diferentes na forma como a assessoria técnica aos PCTs deve ser realizada. Um dos acordos extrajudiciais, o TAC-Gov, prevê como um de seus princípios “o reconhecimento das especificidades e singularidades de cada povo indígena, quilombola e tradicional, quando da reparação integral dos danos”.  Isso porque os PCTs são grupos que possuem formas próprias de organização social, cultural, econômica e religiosa, estabelecendo vínculos e relações próprias com seus territórios. 

Foto: Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira
Foto: Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira

Relatos das comunidades

Na ocasião, a equipe apresentou algumas tarjetas com os principais apontamentos sobre danos identificados pelas comunidades em seus territórios, durante as Oficinas de Participação Comunitárias (OPCs) que aconteceram no mês de abril. Esses danos estão relacionados à qualidade da água; à produção agrícola; à pesca no Rio Doce e em córregos próximos; e à segurança no consumo de peixes da região. A cada tema levantado, as pessoas presentes puderam relatar seus entendimentos sobre as alterações observadas nessas práticas depois do rompimento da barragem

Moradores da comunidade de Surrão apresentaram insegurança sobre a contaminação das águas na região de São Domingos do Prata. Destacaram, também, que a sobrecarga do sistema de saúde após o rompimento da barragem de Fundão tem ocasionado perda de qualidade e dificuldade de acesso das comunidades quilombolas ao serviço público em hospitais de referência da região, como o localizado em Ponte Nova.  

Em relação às produções agrícolas, morador de Bateeiro afirmou que “as hortas não estão saindo, porque os caramujos estão invadindo as plantações. As mangas e abóboras estão todas com bichos”, e acrescentou que isso também tem aumentado desde o rompimento. 

Outros moradores relataram, durante a atividade, que os produtos que eram plantados nas comunidades não crescem mais, ficam amarelados; afirmaram que ainda consomem alguns desses alimentos, mas não se sentem seguros; e também passaram a comprar alguns dos produtos que antes eram produzidos em seus quintais, acarretando mais gastos.  

Já em relação à pesca e ao lazer, o morador de Surrão contou que ia para o Rio Doce, “acampava na beirada do rio, era um divertimento, a gente pegava muito peixe e isso acabou. Foi muito triste, eu me sinto prejudicado”. Outra moradora de Areião relatou, também, que sua família nunca pescou para vender, mas pescava por lazer, “as crianças gostavam de ir junto brincar, de ver os adultos pescando, então sempre teve essa questão da pesca por diversão. Antes tinha muito peixe, agora a gente não vê mais”, afirmou. 

Durante o encontro, a equipe da ATI apresentou algumas orientações sobre possibilidades de encaminhamentos das demandas em saúde pontuadas pelos moradores das comunidades. 

Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira

Linha do tempo do processo de reparação

No segundo momento da reunião, a equipe da Cáritas Diocesana de Itabira apresentou um breve histórico do processo de reparação, desde o rompimento da barragem, a ação civil pública, as ações entre os estados e acordos que surgiram desde então. Também explicou sobre os programas de indenização e o Auxílio Financeiro Emergencial (AFE); os cadastros; o papel da Fundação Renova e os Programas que foram criados para atender os territórios atingidos. 

Moradores das comunidades comentaram sobre a presença de advogados na região, com a abertura dos processos indenizatórios, mas, ao mesmo tempo, a falta de informações recebidas. Alegaram, também, o racismo institucional praticado pela Fundação Renova, que não dialoga com as comunidades quilombolas da região. 

Espaço de troca e reconhecimento

A Assessora Técnica da equipe de Humanidades e Educação, Monalisa Carmo, afirma que “o encontro com PCTs sempre nos coloca diante de novas questões e possibilidades de atuação. A organização comunitária de Bateeiro, Areião e Surrão nos permite ir ao encontro de um espaço em que a organização coletiva e política contribui muito para a construção de uma discussão sobre os danos gerados pelo rompimento. Ao longo da escuta dessas pessoas, percebemos uma série de desafios enfrentados desde o rompimento: são os saberes ameaçados por uma juventude que passa a enfrentar ainda mais dificuldades para permanecer na comunidade; os casos de adoecimento associados a água; as relações construídas no contato com o rio, como a pesca que para além de uma fonte de renda, tem um valor cotidiano”. 

A Cáritas Diocesana de Itabira considera esses momentos de diálogo com as comunidades tradicionais, a partir de elementos do cotidiano de cada núcleo familiar, muito importantes para o reconhecimento das múltiplas dimensões dos danos e para que medidas de reparação estejam alinhadas com as realidades dos territórios tradicionais.

Foto: Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira
Foto: Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira

Atendimentos de demandas

Ao final da reunião, a equipe da ATI realizou atendimentos de pessoas que desejaram apresentar suas demandas individualmente. O registro e tratamento de demandas é parte de um esforço contínuo para garantir a participação informada dos(as) atingidos(as) pelo rompimento da barragem de Fundão, bem como ouvir as necessidades das comunidades assessoradas pela Cáritas Diocesana de Itabira.

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