Saúde das pessoas atingidas dos Territórios 01 e 02 é tema de seminários virtuais

As informações foram levantadas pelas ATI, através da escuta das pessoas atingidas, nas mais diversas atividades realizadas junto às pessoas atingidas desde março de 2023. 

 

No dia 12 de agosto, a ATI realizou dois seminários virtuais com pessoas atingidas dos Territórios 01 (Rio Casca e Adjacências) e 02 (Parque Estadual do Rio Doce e sua zona de amortecimento), com o objetivo de apresentar  informações sobre os danos identificados na saúde física e mental das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão

Para o levantamento dessas informações, a ATI realizou, desde março de 2023, três tipos de atividades com as pessoas atingidas: 1. Aplicação de formulários do Registro Familiar (RF); 2. Atendimento individualizado de demandas, nos pontos de apoio ou no formato de mutirão nas comunidades; e 3. Oficinas de Participação Comunitária (OPCs). 

No seminário, Geisiane Lima, Coordenadora Geral da ATI Cáritas Diocesana de Itabira, falou sobre a importância da participação das pessoas atingidas em todos os levantamentos de informações feitos pela ATI e a relevância dessas informações no processo judicial. “Todos os levantamentos feitos até hoje foram com a participação de vocês. Nos preocupamos em trazer esses elementos, mesmo que técnicos, de forma e em linguagem acessível. Essas informações vão servir de embasamento para as Instituições de Justiça, para o juiz nas tomadas de decisões, nas petições, para que a reparação de fato seja justa e alcance todas as pessoas atingidas.”

Dados levantados através do Registro Familiar

No Registro Familiar, foi identificado que, no Território 01, das 530 pessoas que responderam questões referentes à saúde humana, 189 relataram sofrer problemas na saúde física e 87 sofreram/sofrem problemas de saúde mental. Além disso, mais de 86% das pessoas afirmam que começaram a fazer uso de medicamentos após o rompimento da barragem. 

Já em relação ao Território 02, das 687 pessoas que responderam às questões referentes à saúde humana, 278 relataram problemas na saúde física e 155 sofreram/sofrem problemas de saúde mental. Desse total, mais de 89% das pessoas disseram que começaram a fazer uso de medicamentos após o rompimento da barragem. 

Informações  levantadas por meio de atendimentos e atividades coletivas comunitárias 

Desde o início das atividades, a ATI vem identificando informações referente aos impactos e aos danos em saúde humana citados pelas pessoas atingidas durante atendimentos individuais, coletivos ou oficinas comunitárias. 

O levantamento de informações desses atendimentos foi dividido em 16 categorias como: problemas de pele (coceira, manchas, alergias, etc); problemas gastrointestinais (diarreia, vômitos, dores de barriga, etc); problemas de saúde mental (ansiedade, depressão, tristeza); problemas renais (infecção urinária, insuficiência renal); problema cardiovascular; problemas de saúde (piora, saúde fragilizada, desmaio); agravamento de doenças crônicas (diabetes, pressão alta); aumento de arboviroses (dengue, chikungunya, zika); problemas respiratórios (sinusite, rinite, doenças respiratórias como bronquite, etc.); verminoses; dores de cabeça (passou a ter desde o rompimento); dependência (uso de álcool ou outras drogas); câncer; ideação suicida; uso de medicamentos (iniciou ou aumentou o uso após o rompimento); dificuldade de acesso à rede de saúde. 

Observando, as informações levantadas em cada um dos  dos 13 municípios assessorados, foi possível identificar que os danos relacionados a problemas de pele são citados em 12, dos 13 municípios atingidos dos Territórios 01 e 02, bem como relatos de questões  em saúde mental e aumento do uso de medicação pós rompimento. 

Foto: João Carvalho/Acervo Cáritas Diocesana de Itabira
Foto: João Carvalho/Acervo Cáritas Diocesana de Itabira

O que mais a ATI abordou no Seminário? 

Além disso, a equipe da ATI abordou aspectos do Programa de Apoio à Saúde Física e Mental da População Impactada (PG14), de responsabilidade da Fundação Renova, que tem como objetivo minimizar os impactos à saúde das pessoas atingidas após o rompimento e desenvolver atividades de apoio à saúde física e mental.  

Porém, após quase 9 anos do rompimento, os estudos epidemiológicos e toxicológicos em saúde não foram sequer iniciados. Em 2020, a Fundação Renova judicializou esse tema, afirmando discordar dos estudos que estavam sendo levantados até então. Em recente decisão, entretanto, já tendo a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) como responsável pela realização dos estudos, o juiz Vinicius Cobucci exigiu que os estudos fossem iniciados, cabendo à Fundação Renova o custeio da atividade. 

Dentro do PG14 está previsto, também, a elaboração de Planos de Ação em Saúde (PAS), que devem considerar estratégias de atendimento à saúde da população atingida para minimizar os danos e riscos decorrentes do rompimento. Os PAS devem ser elaborados pelas Secretarias de Saúde de cada município atingido, dialogando com as pessoas atingidas e Assessorias Técnicas Independentes (caso solicitado). Eles devem ser apreciados pelos Conselhos Municipais de Saúde e  Comissões Locais  de Atingidos(as) Municipais. 

Até o momento, porém, nenhum PAS dos municípios localizados nos Territórios 01 e 02 foram executados, mesmo já tendo sido aprovados pelo Comitê Interfederativo (CIF). A Renova alega que, para a realização do PAS, é necessário antes a realização dos estudos epidemiológicos e toxicológicos que comprovem a relação desses danos com o rompimento. 

Além disso, o PG14 também prevê ações de monitoramento da qualidade da água para consumo humano. Os pontos de monitoramento são indicados pelas prefeituras de cada município. Nos Territórios 01 e 02 existem poucos desses pontos. Na última reunião da Câmara Técnica sobre Saúde (CT-Saúde), que ocorreu entre os dias 22 e 23 de julho, pessoas atingidas reivindicaram mais esclarecimentos sobre os resultados desse monitoramento. 

Confira algumas falas das pessoas atingidas durante a atividade

Durante o Seminário, as pessoas atingidas foram convidadas a se manifestar, contribuir com as informações apresentadas e tirar possíveis dúvidas com relação aos danos na saúde em cada município. 

A moradora da Biboca (São José do Goiabal), Simone Nunes, afirmou que “não é espanto nenhum e o gráfico já mostra a realidade do nosso lugar. O que mais nos preocupa é a água, né? É muito ruim e todo mundo sabe, a água que a gente tá tomando aqui, o mau cheiro. O gráfico já mostra e a gente tem que estar mais atento à saúde”. 

Márcio Gomes, de Revés do Belém (Bom Jesus do Galho), confirmou que os dados refletem o que é sentido cotidianamente nas comunidades atingidas. “Esses dados realmente têm crescido na nossa região, principalmente sobre ansiedade, depressão após o crime ambiental. Foi algo que atingiu todas as pessoas da calha e trouxe insegurança. Tive arritmia, mudança de pressão, ansiedade, tomo três qualidades de remédios. Pessoas adoeceram e faleceram com o descaso das empresas que cometeram esse crime. Pessoas com problemas de pele, dor de cabeça e algumas doenças relacionadas a doenças mentais. Muito bom ter levantado esses dados porque é o que a gente convive hoje, em 2024. Ansiedade, medo e angústia.”

Marizete, da Biboca (São José do Goiabal), comentou que, na época do rompimento, “toda hora saía um carro pra Goiabal, pro hospital. Naquela semana, foi quase durante toda semana, nós tínhamos que estar no hospital. O fedor que deixou, deixou aquele ‘trem’ parece na cabeça da gente. Toda vez que chegava gente aqui, a gente tava com febre, dor de cabeça e corpo ruim. Depois desse desastre pra cá, até hoje, muita gente tá doente ainda”.

Ao final do Seminário, os(as) participantes aproveitaram para esclarecer dúvidas com relação ao PG14, os estudos que devem ser iniciados pela Fundação Renova e os recursos que os municípios  receberão para  fortalecer a saúde pública. A equipe da ATI reforçou a importância do fortalecimento e protagonismo das Comissões de Atingidos(as) na cobrança de respostas tanto dos municípios, bem como da Fundação Renova, dos representantes das Câmaras Técnicas e das Instituições de Justiça. 

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