Comunidade quilombola Grota dos Bernardos: memória, identidade e participação fortalecem a busca pela efetivação de direitos

No dia 12 de dezembro, a comunidade quilombola Grota dos Bernardos, localizada no distrito de Santana do Tabuleiro, em Raul Soares, se reuniu com a ATI prestada pela Cáritas Diocesana de Itabira. O encontro teve como objetivo dialogar sobre o processo de reparação dos danos decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, as principais demandas locais e o direito à Assessoria Técnica Independente.

A atividade contou com a participação de mais de 30 pessoas e iniciou com a exibição do documentário “Relatos Invisíveis”, produzido pela Cáritas Diocesana de Itabira. Após o documentário, os(as) moradores(as) compartilharam suas percepções e sentimentos em relação às consequências do rompimento da barragem de Fundão na vida de quem vive na comunidade. 

No segundo momento do encontro, os(as) participantes(as) relataram, a partir de objetos representativos da realidade e história locais, aspectos do território, pertencimento e modo de vida. Ronilda, por exemplo, levou uma lamparina, que servia para iluminar o caminho quando saíam à noite pelas estradas da comunidade. Ela também levou um ferro de passar roupa que a família tem há mais de 80 anos, pontuando que as crianças das novas gerações não conhecem mais o objeto e nem saberiam como utilizá-lo. 

Na reunião, ainda  foram apresentados as linhas gerais do Acordo de Repactuação do Caso Rio Doce, homologado em 06 de novembro, e discutida a importância da organização comunitária para controle social das medidas e recursos que serão destinados aos municípios e às comunidades. No final do encontro, foi abordado o direito dos povos e comunidades tradicionais à consulta Prévia, Livre, Informada e de Boa-fé, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Como o apoio da ATI Cáritas Diocesana de Itabira, a comunidade se organiza para estruturar a associação quilombola, realizar a inscrição dos(as) moradores(as) no Cadastro Único da Agricultura Familiar (CAF) e solicitar o  acesso a programas ações governamentais específicos para povos e comunidades tradicionais. Localizada em um município atingido pelo rompimento de Fundão, a comunidade estará atenta aos recursos destinados ao município e às medidas de reparação previstas no âmbito do Acordo de Repactuação do Caso Rio Doce.    

Sobre o encontro, Sr. Rubens das Graças Bernardo afirma: “Foi muito importante a reunião aqui pra nós, falamos sobre muitas coisas que acontecem na nossa comunidade aqui. [...] Acho muito importante vocês estarem promovendo esse trabalho na nossa comunidade”. 

Ao final da atividade, os(as) representantes da ATI, em conjunto com a comunidade, definiram os melhores horários, locais e formato das próximas reuniões, que ocorrerão ao longo dos próximos meses.

Foto: Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira
Foto: Júlia Militão/Cáritas Diocesana de Itabira

Memória, identidade e reconhecimento

De acordo com relatos de Rubens, morador da comunidade, o quilombo dos Bernardos foi fundado por seu avô, Joaquim José Bernardo, em um processo de resistência e  fuga da realidade de escravização a qual ele e sua família foram submetidos. “Eles eram obrigados a fazer o que o patrão mandava, eram muito castigados e não tinham recurso. O meu pai contava que, no dia deles fugirem de onde estavam residindo, foi preciso arrumarem a roupa a noite, colocar tudo na mala e deixar no jeito para fugir de madrugada. Lá pelos meios de Governador Valadares pra cá”, contou. 

Joaquim e a família encontraram em Santana do Tabuleiro um lugar para assentar e desenvolver a comunidade. “Eles entraram aqui de facão, não tinham outro recurso para devas a área aqui. Foi pelejando, até que abriram a área e construíram a casa dele. Graças a Deus hoje já está todo mundo mais ou menos acomodado”. 

No ano de 2006 a comunidade foi reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares. Esse reconhecimento possibilita às comunidades quilombolas o acesso a uma série de políticas públicas e programas do governo, o que ainda não é uma realidade em Bernardos. 

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